Portal Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Estado do Rio Grande do Norte

Educação, Ciência, Cultura e Tecnologia em todo o Rio Grande do Norte

Projeto de Pesquisa

A FORMAÇÃO DOS QUADROS DOCENTES DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

Concluido

O que sabemos sobre a formação profissional da professora primária e sua atuação? Corroboramos a inversão das perspectivas historiográficas tradicionais promovidas nos últimos anos, com o intuito de evidenciar a presença das mulheres professoras, numa história das práticas do cotidiano educacional, ensejando a inserção das relações de gênero como categoria da história. (Scott, 1995).

Que relações conflituosas se estabeleciam no espaço de sociabilidade que é a instituição escolar? O que reivindicavam as mulheres professoras? Como se dava a partilha entre os polos feminino e masculino nessa configuração?

No início do século XX assistimos à uma reapropriação de uma questão antiga: os papéis sexuais de homens e mulheres entre o público e o privado. Neste contexto, a escola emerge também como cenário de disputas. Professores e professoras, homens e mulheres, agentes públicos regulados pelo Estado.

Ao mesmo tempo em que se pauta a inaptidão das mulheres, um tema de reflexão de Auguste Comte (1798-1857), o qual tratava da “inaptidão radical do sexo feminino para o governo, mesmo da simples família”, em virtude da “espécie de estado infantil contínuo” que caracterizaria o sexo feminino. Mesmo no micro-espaço doméstico há uma fronteira variável entre o público e privado. O doméstico não lhe poderia ser entregue sem controle, mas concorda-se em confiar às mulheres – dentro de certos limites – a família, a casa, núcleos da esfera privada. (Perrot, 1998, p.178).

Estaria a “divindade do santuário doméstico” ameaçada com a inserção profissional feminina, mesmo que no contexto da escola? Se a mulher era investida de um poder social no lar, por outro lado, na escola sua atuação, ainda que pública, se restringiria à sala de aula, extensão das virtudes encontradas do cenário doméstico.

Emergem as conquistas femininas, do esboço tímido de uma inversão de papéis pela mulher emancipada que reivindica direitos civis e políticos, o acesso às profissões intelectuais e recusa confinar-se à “vocação materna”

Mesmo que subjacente ao poder feminino também irrompam linhas argumentativas quanto ao risco da degenerescência da raça e de decadência dos costumes. Esta questão biológica e moral foi reforçada pela tese do “celibato pedagógico” defendida no meio intelectual e educacional brasileiro à época. “O trabalho fora seria aceitável para as moças solteiras até o momento do casamento, ou para as mulheres que ficassem sós – as solteironas e viúvas.” (Louro, 2004, p.453). O magistério enquanto espaço profissional possível à mulher é a discussão posta.

Nestor dos Santos Lima (1921; 1927), professor e diretor do Departamento de Educação do Rio Grande do Norte, discorrendo acerca do celibato pedagógico ou da condição da mulher em face da educação e do ensino como profissão habitual, trazia à baila a discussão sobre a repopulação na Alemanha e na Áustria, numa clara alusão à condição da mulher enquanto progenitora. Além disso, apresentava dados da época para corroborar esta questão ao sinalizar o fato de que a Reforma do Ensino Primário no Estado de Minas Gerais deixara de fora as mulheres professoras casadas, uma vez que somente estavam habilitadas mulheres solteiras ou viúvas sem filhos.

 

E agora, que vem ser concedido à mulher o direito do voto, pela legislação eleitoral de meu estado (Rio Grande do Norte), e, pois, a perfeita equiparação dos dois sexos na ordem política, o problema deverá ser novamente examinado, a fim de ser resolvido convenientemente. O que a prática nos ensina, diária e diuturnamente, é o que o exercício simultâneo das duas funções – doméstica e pedagógica – se não são absolutamente incompatíveis são, ao menos, prejudiciais à perfeição, à regularidade e à proficuidade de cada uma delas (Lima, 1927, p.6-grifo nosso).

 

Em evidente referência ao movimento sufragista feminino do início do século XX, no qual o Estado do Rio Grande do Norte foi referência no país com a primeira eleitora, a professora normalista Celina Guimarães Viana, e a eleição de Alzira Soriano, primeira prefeita da América Latina, o mesmo educador incitava o reavivamento da discussão sobre a questão da inserção feminina na educação, nos espaços sociais, sinalizando os prejuízos ou a incompatibilidade da realização de duas tarefas somente às mulheres. Contudo, a formação de mulheres professoras e sua atuação era uma realidade no início do século XX e, este educador, esteve diretamente implicado nesta formação.  

Em resposta às questões postas inicialmente, assinalamos que as reivindicações por formação e atuação profissional feminina foram atendidas após a luta por inserção nos cursos de formação e atuação profissional. Apesar dos conflitos com o outro sexo, as mulheres professoras alcançaram seus espaços e protagonizaram cargos de direção, mesmo que tardiamente.

Muitas foram as professoras primárias diplomadas pelas Escolas Normais e em atuação nos cursos primários, como também em cargos e instituições diversos. Elas foram precursoras de uma formação e atuação que assumiram percursos convergentes e, às vezes, distintos. No caso do Rio Grande do Norte, as professoras prestaram importante contribuição à docência de gerações, às ações de planejamentos das instituições as quais estiveram vinculadas. Protagonizaram movimentos de relevância no estado e no país na curta e na longa duração da história de instituições. Professoras com formação pedagógica e engenheiras as quais são potenciais objetos de análise, a exemplo de: Anaíde Dantas, Crisán Siminéa, Eleucia Bandeira Luz, Espedita Oliveira de Medeiros, Maria Alexandrina Sampaio, Maria de Lourdes Alves de Souza, Nalva Ramos, Ody Freire de Oliveira. A história de suas formações e atuação contribuem à compreensão da formação de professores e à atuação profissional das mulheres.