Cindih
Educação e democracia em pauta: instituições do RN realizam 1º Congresso Internacional de Direitos Humanos
Com conferencistas internacionais e ampla programação cultural, encontro integrado discute a dignidade humana e os desafios da educação prisional e social.
Publicada por Jose Nascimento em 11/12/2025 ― Atualizada em 11 de Dezembro de 2025 às 10:17
Sob a temática "Educação em Direitos Humanos e vulnerabilidades nas democracias contemporâneas", o Auditório da Reitoria da UFRN sediou, na noite de 10 de dezembro, a solenidade de abertura do 1º Congresso Internacional de Direitos Humanos (Cindih). O evento, fruto de uma parceria estratégica entre o Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa) e a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), iniciou-se com a apresentação cultural do espetáculo "O Peso do Pigmento", encenado pelo Grupo Andaluz de Teatro. A performance artística serviu de prelúdio para a formação da mesa de honra, que contou com o reitor do IFRN, José Arnóbio de Araújo Filho, e representantes das demais instituições parceiras e da comissão organizadora.
O ponto alto da noite foi a conferência ministrada pelo professor Fernando Bessa, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho (Portugal). Perguntado sobre de que forma vê as contribuições possíveis de instituições educacionais, como o IFRN, para o fortalecimento dos direitos humanos em um cenário de crescente fragilidade da democracia, Fernando Bessa deu "uma resposta muito convencional de alguém muito conhecido", o brasileiro Paulo Freire. "Eu creio que a resposta a tudo o que está a acontecer é desenvolver, nós usamos uma expressão diferente, mas é desenvolver no brasileiro, a conscientização", afirmou.
Para explicar como esse processo ocorre na prática, o conferencista defendeu a prioridade da capacidade de crítica e julgamento sobre o ensino passivo de bancada. "Eu sempre digo aos meus alunos: desconfiem de tudo aquilo que eu vos digo", provocou Bessa, ressaltando que esse ceticismo é o "caminho absolutamente necessário" para desenvolver uma consciência crítica em relação às injustiças e sofrimentos do mundo.
Ainda sobre a integração acadêmica, o coordenador geral do evento e professor do IFRN, Avelino Neto, destacou a relevância da união entre o Instituto e as universidades públicas (UFRN, Ufersa e UERN). Segundo ele, essa parceria é essencial para ações de natureza transversal que fazem parte da vida institucional de pesquisadores e da sociedade civil. "Pensar os direitos humanos passa por educação. Então, não tem como fazer isso sem levar em conta as instituições de ensino superior", concluiu Avelino.
Programação extensa e debates plurais
A agenda do 1º Cindih estende-se de terça (9) a sexta-feira (12), ocupando espaços no IFRN (Campi Natal-Central e Zona Leste) e na UFRN. Além das conferências com convidados internacionais, o evento funciona como um "guarda-chuva" para exposições artísticas, lançamentos de livros e encontros simultâneos, como o Simpósio de Educação Prisional (SIP), a Formação em Liderança Feminina (Forlif) e a reunião do Fórum de Universidades pela Paz (Foup).
Antes mesmo da cerimônia oficial de abertura, a troca de saberes teve início na tarde do primeiro dia do evento (9). Os auditórios do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA) da UFRN concentraram parte da programação, com a realização simultânea de Grupos de Trabalho (GTs) que reuniram pesquisadores, estudantes e profissionais.
Para o servidor do IFRN, Adriel Kelvin, discutir sobre os direitos humanos é crucial no contexto atual. “A importância de discutir gênero hoje está muito forte, frente aos inúmeros feminicídios divulgados nas redes sociais e nas TVs. Discutir todas essas temáticas, para mim, atravessa de uma forma muito significativa”, disse. Adriel ainda ressaltou que o nível acadêmico apresentado nos GTs acrescentará novas discussões necessárias para avanços sociais.
Além desses tópicos, outros GTs abordaram temas como: Direitos Humanos e Inclusão no Ensino Superior e na Educação Profissional, com foco em experiências de permanência e acessibilidade; Direitos Humanos para um Futuro Sustentável e Justo, discutindo as relações entre justiça social e educação ambiental; Direitos Humanos e Teoria Social; e, por fim, Direitos Humanos, Corpo e Saúde, com ênfase no SUS e na saúde mental.
Literatura e arte como práticas de resistência
Ainda no dia 9, no auditório C, o GT 3 - Direitos Humanos, Vozes Vulneráveis e Estéticas da Resistência destacou o papel da literatura e das expressões artísticas na formação humana. Entre os trabalhos apresentados, esteve a experiência conduzida pelo professor Luiz Alberto Celestino Pessoa Pimentel, do Campus Parnamirim do IFRN, que compartilhou os resultados do projeto “A Literatura como um Direito Humano”, voltado ao letramento literário de estudantes do Ensino Médio Integrado.
Durante a apresentação, o professor ressaltou que o estudo das obras literárias contribuiu para a formação de estudantes mais críticos e sensíveis. Em um dos depoimentos lidos, um estudante relacionou a experiência de uma personagem às próprias vivências familiares: “Eu me lembrei de que Maria é a minha mãe, porque em algum Natal as sobras da casa da patroa vinham parar na nossa mesa, mas só agora eu consigo perceber o lugar em que eu estava.” Outro estudante relatou a identificação com a obra “Insuportáveis”, de José Falero: “Quando eu li os dois primeiros capítulos, eu disse: ‘meu Deus, isso é praticamente a realidade em que estou inserido’ [...] Mesmo eu tendo saído dessa realidade, hoje eu sei que posso mudar esse jogo - e vou mudar.”
Da prisão à cidadania: desafios da reintegração
Simultaneamente às atividades na UFRN, a manhã de quarta-feira (10) foi marcada pela abertura do Simpósio de Educação Prisional (SIP), realizada no Museu de Minérios do Campus Natal-Central do IFRN. Durante a solenidade, o reitor José Arnóbio reafirmou o compromisso da instituição com a construção de oportunidades educativas dentro e fora do sistema penal, destacando que a educação “é um caminho possível para a dignidade, para a autonomia e para a reconstrução de trajetórias”.
Ao defender a necessidade de se sonhar com uma sociedade mais justa e humana, Arnóbio lembrou que o intercâmbio de experiências proporcionado pelo evento é fundamental, pois "ninguém sabe tudo" e o crescimento ocorre justamente no diálogo com o outro.
A conferência de abertura do Simpósio foi conduzida por Mayesse Parizi, diretora de Cidadania e Alternativas Penais da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen). Ela iniciou sua fala provocando uma reflexão crítica sobre o próprio título da palestra, "Da prisão à cidadania", argumentando que "há algo de errado quando a prisão aparece antes da cidadania".
Parizi apresentou dados que mostram o Brasil ultrapassando a marca de 700 mil pessoas privadas de liberdade. Diante desse cenário, ela foi enfática: “Se o país escolheu privar pessoas de liberdade como resposta à violência e o resultado não tem sido mais segurança, então algo precisa ser urgentemente revisto”. A palestrante alertou ainda para a urgência de preparar a sociedade para a reintegração social, lembrando que, a cada semestre, cerca de 230 mil pessoas deixam as unidades prisionais e precisam de articulação para reorganizar suas vidas em liberdade.
Mais informações
Para conferir a programação completa e acompanhar os detalhes do evento, acesse a página oficial do 1º Congresso Internacional de Direitos Humanos e4º Seminário de Direitos Humanos. Aproveite também para visualizar os registros e a atmosfera do congresso no álbum de fotos do primeiro dia.
*Esta notícia foi feita de forma colaborativa por Cleyton Fernandes, Ester Costa, Max Praxedes e Mirelly Sampaio, que integram parte da equipe de Jornalismo e Imprensa da Diretoria Sistêmica de Comunicação Institucional do IFRN.