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Educação

A Educação Profissional no Estado Neoliberal

Pesquisa analisa como a educação pode se tornar um instrumento de dominação do capital sobre a humanidade

Publicada por Maria Macedo em 04/05/2023 Atualizada há 1 ano, 1 mês

Quais são as implicações sociais e políticas da massificação da educação profissional? É o que o artigo "Estado Neoliberal e Educação Profissional no Brasil: Transformações de Paradigmas em Nosso Circuito Histórico", desenvolvido por Shilton Roque, Yossonale Alves e Márcio Azevedo, servidores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) busca refletir.

O trabalho analisa a tendência de massificação da educação profissional, a partir de cursos de curta duração, cuja oferta vem sendo inserida na dinâmica do mercado, transformando a educação em um produto vendável. Publicado na revista do Instituto de Direito Público, o artigo faz parte do material de estudo da pesquisa do atual doutorado de Shilton, que tem como foco principal o papel e o lugar dos cursos técnicos subsequentes na atual dinâmica do capitalismo.

A pesquisa publicada em 2021 parte dos conceitos: Estado e modelo neoliberal e o seu papel enquanto gestor. O Estado neoliberal é visto como a forma política hegemônica do nosso circuito histórico que sustenta o modo capitalista de produção e reprodução social. O modelo neoliberal é uma resposta à crise do fordismo e resultado da luta de classes nesse período. O Estado é um gestor da crise estrutural do capital, pois as políticas que o conformam agudizam a exploração capital-trabalho e retiram os amortecedores deste conflito nos termos da sociabilidade capitalista.

Segundo os autores, o capital via Estado neoliberal privatiza toda a esfera estatal que é passível de lucratividade, transformando direitos conquistados em serviços a serem comprados no mercado. A educação profissional é uma das políticas de Estado que ganha centralidade no neoliberalismo, transformando o trabalho para que ele possa responder à tendência da queda da taxa média de lucro em um capitalismo financeiro. A pesquisa aponta que mesmo nas universidades públicas, espaços voltados para debate crítico e mobilização dos trabalhadores, os professores têm progressões na sua carreira com base em avaliações produtivistas.

Instrumento de dominação?

De acordo com o estudo, a educação pode se tornar um instrumento de dominação do capital sobre a humanidade, trabalho e educação. Ainda, a pesquisa afirma que a educação profissional é uma das mediações necessárias para o movimento metabólico desse sistema, garantindo a subordinação do trabalho ao capital e a reprodução do capital e suas formas sociais.

No decorrer da pesquisa, os autores afirmam que, a vinculação entre educação e trabalho é essencial, transformando a cada mudança do modo de produção e organização social. Eles mencionam que no Brasil, em um cenário de Estado capitalista neoliberal, a educação profissional é resultado dos conflitos entre as políticas públicas e a luta de classes. Para os autores, é importante considerar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) vigente no que concerne à educação profissional, que já é resultado do ascenso do pensamento político neoliberal.

A investigação indica que a LDB, aprovada em 1996, separou a educação profissional da educação geral imprimindo na letra da lei a dualidade educacional, marcando a nossa história como país com maior número de matrículas em cursos de curta duração e carga-horária média de 180h, além de um maior aporte de recursos em instituições privadas. Nesse período, educação e o trabalho passaram a ocupar um lugar específico para o neoliberalismo, o que colaborou para a dinamização do circuito do capital, incentivando a oferta educacional por instituições privadas e atendendo ao movimento neoliberal de uma educação voltada para o mercado, segundo a pesquisa.

O estudo destaca como o neoliberalismo transformou os direitos sociais em "serviços a serem adquiridos", resultando no desmonte da proteção social, o que tornou os trabalhadores mais exigentes (e mais caros) para os empregadores. Destaca ainda que, a aposta na empregabilidade e no empreendedorismo na educação e a crescente oferta de formação profissional de curta duração limitam os alunos às exigências técnicas e sociais do mercado de trabalho.

O texto reintera que a contrarreforma do ensino médio e o congelamento de gastos do governo brasileiro aceleraram o alinhamento da educação profissional do país com o capitalismo neoliberal, levando à profissionalização precoce, menos educação e contratação de professores não qualificados. Conforme a pesquisa, a tendência de contratar professores por meio de aplicativos e a ascensão da "economia gig" agrava ainda mais a questão do trabalho precário, desvaloriza o trabalho e reduz as proteções sociais. 

Educação e trabalho

Apesar dos avanços na educação profissional, existem políticas como o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) que permitem que instituições privadas tenham acesso ao fundo público e gerem um processo de mercantilização na educação, segundo o estudo. O mesmo ainda reflete que as tendências do Estado capitalista neoliberal e da forma estatal capitalista levam à competitividade, individualização, precarização do trabalho e ampliação da oferta de cursos de curta duração em detrimento da formação mais completa e integral dos jovens. Os autores afirmam que esses processos buscam dinamizar o mercado e o fluxo do capital, mas acabam instrumentalizando e mercantilizando a educação.

A pesquisa conclui que o modo de produção capitalista exige uma forma política estatal para sustentá-lo, principalmente na submissão do trabalho assalariado ao capital e na propriedade deste capital extraído e acumulado. Segundo ela, em tempos de crise estrutural do capitalismo, a forma de Estado capitalista que atenderá a essa crise será a forma neoliberal, que se caracteriza pela financeirização, despossessão de direitos e bens coletivos, agudização das desigualdades e hiper individualização dos sujeitos. 

Por fim, o artigo "Estado Neoliberal e Educação Profissional no Brasil: Transformações de Paradigmas em Nosso Circuito Histórico" encerra sustentando que a política do Estado essencial para a reprodução do capital em sua forma neoliberal é a educação profissional, que legitima as práticas sociais e técnicas exigidas pelo neoliberalismo. A educação profissional no Brasil, nos últimos 30 anos, de acordo com a pesquisa, tem sido marcada por políticas de oferta em larga escala de cursos de curta duração e pelo discurso da empregabilidade e empreendedorismo. Os autores ressaltam que a luta por uma educação e trabalho emancipatórios deve estar associada a uma estratégia que busque a conquista do Estado e a superação da sociabilidade do capital e do trabalho assalariado.

Sobre o autor

Shilton Roque dos Santos é mestre em Educação, bacharel em Direito e Advogado. Atualmente é Assistente em Administração no IFRN. Tem um histórico de militância nos movimentos sociais desde a presidência do Grêmio Djalma Maranhão do CEFET-RN (2006) à Coordenação Geral do Sinasefe Nacional (2012-2014). Mestre em Educação Profissional, o servidor é autor do livro Ligando Campos - Estado, Avaliação e Educação Profissional do Campo, publicado pela Editora IFRN. Atualmente, cursa doutorado sanduíche no IFRN e a Universidad Complutense de Madrid.

Estado Neoliberal e Educação Profissional no Brasil: Transformações de Paradigmas em Nosso Circuito Histórico