ESPORTE
Entre reis, damas e peões: o xadrez que forma e transforma alunos e professores
O jogo milenar é ferramenta de formação educacional dentro da comunidade acadêmica do Campus Natal-Central
Publicada por Davi Silva em 20/07/2024 ― Atualizada há 4 meses
No dia 20 de julho, o mundo celebra o Dia do Xadrez. O jogo de tabuleiro, criado e difundido pelo planeta há cerca de 15 séculos, transcende o simples entretenimento e desempenha um papel significativo na formação pessoal e acadêmica de milhões de enxadristas, sejam eles amadores, entusiastas ou aqueles que encaram o esporte em um nível competitivo. No Campus Natal-Central não é diferente: o xadrez é uma ferramenta especial de desenvolvimento integral de alunos e servidores.
Originário da Índia, como uma evolução de um antigo jogo conhecido como chaturanga, e detentor de uma história que perpassa quase 1500 anos, o xadrez ganhou gradualmente seu espaço no mundo através de um cenário no tempo-espaço permeado por conquistas territoriais e comércio. Essa tempestade perfeita permitiu que o chaturanga se espalhasse tanto pelo oriente como para o mundo ocidental, o que fez que o jogo evoluísse ao longo do caminho. E foi exatamente durante essa disseminação, passando pelo Irã, Oriente Médio e Europa, que esta atividade lúdica se transformou definitivamente no jogo como o conhecemos.
Função educacional
O xadrez é reconhecido mundialmente por seus benefícios cognitivos. Estudantes que praticam xadrez regularmente demonstram melhorias significativas em áreas como memória, concentração e a tomada de decisão sob pressão. "O xadrez pode contribuir no desenvolvimento do ser humano no sentido de que ele é um jogo primordialmente baseado na lógica e na tomada de decisão. Você sempre está tomando decisões no xadrez, a todo momento, e sempre procurando pela decisão mais correta", afirma o professor Dayvid Marques, professor de matemática do CNAT, além de treinador das equipes de xadrez do campus.
Como matemático, Dayvid utiliza o xadrez como um recurso facilitador para o ensino da disciplina. Porém, ele observa que os alunos que passam a se interessar pelo xadrez de uma forma mais profunda desenvolvem características positivas do ponto de vista comportamental, com benefícios ultrapassam o limiar de simplesmente decidir utilizando a lógica. "O estudante de xadrez desenvolve características que são importantes, como gerenciamento do tempo, controle emocional, aprender a lidar com seus erros, aprender a lidar com a derrota e o respeito ao adversário, entre outras coisas", garante Marques.
IFRN como catalisador
Dayvid aprendeu as regras do xadrez com um primo e desde tenra idade já movia suas primeiras peças pelo tabuleiro. Ao ingressar como aluno no Campus Natal-Central, precisou logo escolher um esporte para praticar. Natação seria sua primeira escolha, mas, no ato da inscrição, soube que as vagas já estavam preenchidas. Diante da frustração, descobriu que ainda havia espaço para o time de xadrez. Sob o comando do professor João Holanda, ele pôde se desenvolver como enxadrista e participou de suas primeiras competições. Porém, após concluir o curso, Dayvid se afastou quase que por completo da prática do jogo.
Somente após entrar como professor do Instituto a paixão pelo enxadrismo encontrou um renascimento - e nunca mais esmoreceu. Passou a instruir alunos interessados, participar de jogos intercampi como treinador e a conviver com outros docentes que o inspiraram - especialmente o professor Francisco Quaranta, do Campus João Câmara. Hoje, Dayvid exerce o papel de mentor para formar estudantes desportistas, como foi o caso de Karina Ingryd, multicampeã de xadrez e aluna egressa do Campus Natal-Central.
A trajetória de uma campeã
"Eu comecei quando eu tinha cinco anos em uma escola lá de Macaíba, cujo nome era Coração da Mamãe. E lá, como era uma escola muito pequena, não tinha quadra, então o único esporte que eles tinham como colocar era o xadrez", conta Karina, que já contabiliza 15 anos de práticas enxadrísticas. Apesar de não ter se empolgado no início, ela contou com o incentivo de um professor do colégio, que enxergou o potencial da menina e começou a levá-la para competir.
Em seguida, Karina participou e sagrou-se campeã de duas edições dos Jerninhos. Era apenas o começo: a menina foi crescendo e logo passou a treinar duas vezes na semana na escola. Sua obstinação ia além dos treinos regulares: ela praticava cerca de duas horas por dia em casa, conciliando com suas outras atividades escolares. Jerns (cinco medalhas de ouro e uma medalha de bronze), Juverns (duas medalhas de ouro), campeonatos estaduais na categoria adulto (vice-campeã): a estudante participava de tudo o que podia.
Ao ingressar como aluna do curso de Controle Ambiental, em 2020, Karina encontrou no Campus Natal-Central o espaço ideal para desenvolver ainda mais suas habilidades no esporte e também como pessoa. "Quando eu passei para o IF, o meu conhecimento em termos de visão de mundo e também do ponto de vista acadêmico aumentou muito, muito mesmo", ela conta. No CNAT, Karina reencontrou o professor Dayvid Marques, que a conhecia desde cedo, quando ela começou a participar das competições.
Nos preparativos para os campeonatos, ela floresceu ainda mais como enxadrista e as companheiras de time seguiam junto, graças à boa convivência entre as colegas e às orientações do treinador. "A gente treinava todo dia, se falava todo dia. A gente via abertura, via defesa, sempre que íamos jogar contra as outras meninas... enfim, a gente via toda essa questão do jogo", conta. Para Karina, que hoje treina xadrez na UFRN, onde cursa farmácia, o jogo milenar é muito mais do que o deslocar de peças no tabuleiro preto e branco formado por 64 casas. "É um esporte que faz parte da minha vida. As minhas conquistas, tanto na questão de estudo, como de pessoa, de personalidade, de disciplina, de ser uma pessoa centrada, de responsabilidade, foi tudo graças a ele", relata a estudante.
Um dos aspectos que chamaram a atenção de Karina - e que contribuiu para o seu desejo de ingressar no IFRN - foi o respeito do qual o jogo desfrutava dentro da instituição. "O xadrez às vezes é um dos esportes que [as pessoas] deixam de lado, por não ser um esporte físico, né? Inclusive foi uma das coisas que eu fiquei muito feliz lá no IF, porque em outras escolas, apesar de eu ter bolsa integral por causa do xadrez, eu não tinha tanto reconhecimento, sabe? Era mais vista pelos meus colegas de turma, mas eu percebi que, desde que eu entrei no campus, todo mundo falava, todo mundo tinha essa paixão também. Diziam "nossa, como é que você consegue jogar isso? É muito difícil!", lembra. Ao todo, Karina reúne 147 medalhas - e contando. Afinal, o jogo não pode parar.